Cássio Vasconcellos

Revista Gol 2018

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O criador do Espaço

Sempre em busca de novos ângulos, o fotógrafo paulistano Cássio Vasconcellos cria ficção a partir da realidade e nos faz refletir sobre o mundo em que vivem

Nas mãos de Cássio Vasconcellos, São Paulo é uma tela vazia, uma cidade suspensa no tempo, onde edificações modernas e pontes inacabadas são apenas fragmentos à espera de uma nova composição. Pelas lentes do fotógrafo, canos de esgoto à beira da Marginal Pinheiros, por exemplo, parecem tinta a óleo do mais intenso vermelho. Mas a metrópole eternizada por Cássio Vasconcellos na série Noturnos, essa de cores reluzentes e construções geométricas cuidadosamente orquestradas, está agora guardada entre as pastas de um armário vizinho à sala na qual o paulistano de 52 anos passa os dias trabalhando e de onde selecionou as fotos aéreas que farão parte da exposição GOL MOSTRA BRASIL, que ocupará os aviões da GOL nos próximos seis meses (veja mais na pág. 78).

Essa visão transformadora da realidade, que foi se aperfeiçoando a cada trabalho e que se tornou praticamente uma marca do fotógrafo, existe desde que ele era menino. Aos 7 anos, utilizando-se da câmera automática do seu pai durante uma ida ao Rio de Janeiro, Cássio clicou prédios inclinados em ângulos de 45 graus e registrou a sombra do bondinho no morro do Pão de Açúcar. “Comecei fazendo coisas diferentes, experimentando outros ângulos. A imagem precisa ter um estranhamento e mostrar algo diverso do que você está acostumado a ver”, explica.

O deboche do irmão mais velho diante das primeiras fotografias, tão ousadas, no entanto, inibiu seu olhar por oito anos, até que uma viagem com os pais para Serra Negra o deixasse de novo sozinho diante da câmera. A decepção, dessa vez, foi na hora da revelação, que resultou em uma imagem cortada e impressa em papel de qualidade ruim. “Percebi ali que o processo automatizado não iria dar certo e que precisaria ter o controle da situação”, conta Cássia. Após a experiência, ele se matriculou em cursos de fotografia na Escola Imagem-Ação, onde permaneceu por dois anos e aprendeu como revelar e ampliar suas imagens.

Cássio era como um pintor que observa a luz e as cores que vão se formando com ela

“Aos 15, Cássio já sabia o que queria, decidiu ainda moleque a questão profissional. Nosso pai falava que ele nasceu pronto”, lembra Paulo Vasconcellos, seu irmão mais velho e autor dos deboches. A declaração, embora soe hiperbólica como cada elogio de família, não é tão exagerada. Tanto que, aos 19, Cássio havia realizado exposições no Museu de Arte de São Paulo e no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. Aos 23, após temporadas em Paris e Nova York, foi contratado como fotojornalista na Folha de S.Paulo, onde participou de um período de renovação estética ao lado de uma leva de fotógrafos jovens e com trabalhos autorais, todos convidados para imprimir seu olhar artístico nas imagens diárias, “o Cássio foi um dos protagonistas desse período. Ele era extremamente detalhista e sempre acrescentava outros elementos à informação puramente jornalística. Era como um pintor que observa a luz e as cores que vão se formando com ela”, conta Luiz Caversan, então editor do jornal.

Nessa época, final dos anos 80, Cássio já estava às voltas com Noturnos, série na qual fez da cidade onde nasceu um ambiente totalmente onírico. Sua mulher, Maria Haller, 47, lembra algumas incursões que fizeram pela capital, no parque Ibirapuera e no alto de torres de telecomunicações. Sem utilizar qualquer recurso técnico, apenas com uma câmera Polaroid SX-70, filmes para luz do dia usados à noite e o auxílio de uma lanterna, Cássio transformava continuamente a paisagem. “Me surpreendia a cada clique. Estava olhando para uma coisa e saía outra, completamente diferente, completamente maravilhosa”, conta Maria.
O olhar estético apurado e o domínio técnico permitiram desde o início que Cássio criasse fotografias no limite entre o real e o imaginário. Na série Navios, por exemplo, ele passou sobre as imagens um algodão embebido no químico revelador para que elas não fossem processadas de maneira uniforme, criando nas embarcações uma atmosfera fantasmagórica. “Eu atuo como criador de um ambiente imaginário. Construo a paisagem e a cidade”, diz.

Controle Aéreo

Apaixonado por voos desde criança, quando pilotava seu helicóptero de brinquedo, Cássio tentou ser escalado para uma pauta que o permitisse clicar do alto durante todo o período em que esteve na Folha de S.Paulo. Foi só em 1989, já fora do jornal, que conseguiu fechar trabalho com um amigo de seu pai que queria fotografias aéreas de seu terreno em Itu. “Era meu sonho de infância, fiquei alucinado, e gostei tanto de achar um ângulo diferente, de cima, como de ver a versatilidade que o helicóptero possui ao ficar parado no ar, voar de lado, subir e descer”, conta.

A experiência foi tão marcante que o fotógrafo decidiu tirar as licenças de piloto privado e comercial e se tornou depois o profissional com maior acervo de imagens aéreas do Brasil. Ainda no curso, somando cerca de cem horas sobrevoando São Paulo, Cássio se surpreendeu com a quantidade de carros na cidade e com a diversidade de sua organização: do alto, ele via não só veículos engarrafados ou recém-fabricados, como também pátios de carros usados, queimados, de viaturas de polícia e de ambulâncias.

Sua percepção do exagero foi o ponto de partida para um de seus trabalhos mais conhecidos, Coletivos, que teve sua primeira fotografia exposta no Museu da Imagem e do Som de São Paulo em 2008. Nele, para dar ideia do tamanho da frota paulistana, Cássio passou seis meses produzindo um painel de 2,2 metros de altura por 1,2 metros de comprimento, no qual se viam 500 mil carros enfileirados. “Não deixa de ser um retrato de qualquer grande cidade. O número representa 1% do que era a frota de São Paulo naquela época e isso é assustador”, diz.

Rotina de Trabalho

O processo exaustivo para criar cenários fictícios em ambientes superpovoados, embora geometricamente organizados, a partir de imagens reais se repetiu em fotos como A praia, na qual Cássio fez de um local deserto em Alagoas um ponto de concentração de banhistas; e Aeroportos, que retrata um pátio enorme ocupado por cerca de 300 aeronaves. “O aeroporto no limite, a praia lotada. Sāo lugares onde não gostaria de estar. O que me chama a atenção são os números descomunais que a humanidade produz para viver”, explica Cássio. A série ocupa até hoje os dias do fotógrafo, que continua buscando dentro da sua coleção aérea situações imaginárias, criadas após infinitas horas no computador, além de dores no braço, cansaço nos olhos e tendinites.

A rotina do escritório Cássio suaviza com as paisagens que vem percorrendo desde 2015. Fotografar a mata para a série Viagem pitoresca pelo Brasil é sua forma de resgatar uma sensação similar a que tiveram os artistas que desembarcaram aqui em 1800 para preencher o imaginário europeu com desenhos sobre a flora e a fauna do Novo Mundo. “Tentei passar a mesma emoção que eles sentiram e tocar as pessoas para temas como preservação da natureza”, diz o fotógrafo, que se viu diante de um jequitiba-rosa de 40 metros de altura e 19 de circunferência no Parque Estadual dos Três Picos, em Cachoeiras de Macacu (RJ).

Frente à árvore de mil anos, ele permaneceu absorto por mais de uma hora após conseguir a fotografia que está agora impressa a jato de tinta no papel algodão e lembra uma pintura. A imagem, capaz de transportar nosso imaginário para 200 anos atrás, retomando o sentimento evocado por obras de nomes como Debret, também nos lembra que essa árvore perante a qual Cássio Vasconcellos quis se curvar, essa que se transformou em quase pintura após passar pela mãos do virtuose que consegue embaralhar nossa noção do mundo, é, na verdade, real, e não foi, ainda, destruída pelo homem.

Sempre que viaja de avião, Cássio Vasconcellos se senta à geiros nas 116 aeronaves – cada Boeing receberá uma obra janela e fica observando a paisagem, tentando reconhecer os lugares por onde já passou. A percepção do fotógrafo, do no mundo, “A GOL é a maior companhia aérea brasileira. Com essa liderança, temos também responsabilidades.” Agimos em várias frentes, inclusive na promoção dos aspectos positivos do Brasil pela cultura e a arte”, diz German Carona, gerente de marketing da GOL. Cássio buscou clique que retratam diferentes espaço brasileiros, propondo reflexões sobre a diversidade e os muitos pontos positivos do nosso país. “O projeto permite que milhões de pessoas tenham acesso a imagens que, normalmente, são expostas apenas em museus”, diz. Após cada mostra, que terá nomes renomados e novos talentos da fotografia, uma das obras será doada para o acervo do Instituto GOL.

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